quarta-feira, 2 de junho de 2021

Relatos de um gato viajante, Hiro Arikawa

 Relatos de um gato viajante, Hiro Arikawa




Havia terminado de ler A CASA DA VOVÓ, um mergulho no horror da ditadura militar de 1965. Precisava buscar um livro que desse descanso ao meu cérebro, algo bem leve e divertido. Escolhi RELATOS DE UM GATO VIAJANTE, da escritora japonesa Hiro Arikawa. Uma fábula leve, mas nem tanto; um livro para “descanso” da mente, porém não foi bem assim. Realmente é divertido ler uma história cujo principal narrador é um gato, um gato de rua. E até que a história começa mais ou menos “pra cima” (pero no mucho): Satoru, um rapaz solteiro, de seus pouco mais de 30 anos, alimenta um gato de rua que dorme sobre a sua van; um dia, ouve os lamentos desesperados desse gato e descobre que ele havia sido atropelado: cuida do bichinho e ambos iniciam uma amizade que só pode existir entre pessoas que gostam de gatos e... um gato. Dá-lhe o estranho nome de Nana (sete, em japonês), porque seu rabo é virado ao contrário, lembrando esse número. Um dia, Satoru, por um motivo desconhecido, precisa livrar-se do gato. Oferece-o a vários amigos em vários pontos do Japão, para onde ele e animal viajam, em busca de abrigo para o gato. Por um motivo ou outro, nenhum desses lugares é conveniente para Nana. Durante essa peregrinação, Satoru relembra seu passado, retoma amizades antigas. A sociedade japonesa, fria como nevascas de inverno, abre-se num raio de solidariedade e de calor humano a partir dos detalhes da vida de Satoru e seu amigo Nana, seu passado e seus amigos. Está lá, nessa fábula emocionante, que jamais se poderia imaginar contada sob a perspectiva dos olhos atentos de um simples gato de rua, uma profunda reflexão sobre a existência humana. Um livro para ler com prazer, mas também, para os mais sensíveis, com um lenço para enxugar as lágrimas, não exatamente pela tristeza, mas pela lição – sem dúvida, um clichê, mas um clichê nunca demasiadamente repetido – de solidariedade diante da transitoriedade da vida. A literatura japonesa contemporânea tem-me surpreendido, com autores que realmente sabem contar uma boa história.


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