Por que você dança quando anda?, Abdourahman A. Waberl
Ao buscar sua filha de oito anos na escola, em Paris, um dia a menina pergunta, ante seu andar “estranho”: “Pai, por que você dança quando anda”? O narrador, para justificar seu modo de caminhar, leva a filha e a nós, leitores, a uma viagem surpreendente por sua origem e sua vida no Djibuti. Sim, estamos falando de um autor nascido na cidade de Djibuti, capital do país de mesmo nome, um pequeno país situado no chamado Chifre da África. Lemos, então, uma narrativa que, se não tem novidades em termos de dificuldades de vida, apresenta-nos um retrato bastante interessante de uma região praticamente ignorada pelo demais países do planeta, exceto pela França, que ocupou seu território e transformou o Djibuti em sua colônia, o que justifica ao narrador o domínio do francês, ao lado da língua nativa. A história de sua infância complicada, quando uma doença que poderia ter sido evitada por uma tríplice vacina quase inutilizou uma de suas pernas e provocou ao garoto de sete anos muito aquilo que hoje chamaríamos de bullying, por parte de garotos mais fortes e violentos. A mãe, desde quando ele nasceu, pouco cuidou dele e depois se preocupou mais com seus dois irmãos menores, uma menina e um menino, enquanto o pai ausente trabalhava duro para sustentar a família. A referência mais profunda do garoto era a avó paterna. Acompanhamos seu esforço para estudar, sua vocação para a leitura e, finalmente, sua ida para a Europa, a constituição de uma família e, agora, o amor à filha. Como disse, uma trajetória típica de jovens pobres da periferia de todos os países do mundo que obtiveram algum sucesso a partir de esforços inauditos para suplantar a situação de marginalização. Repito sempre Machado de Assis: “Ao cabo, só existem ideias velhas caiadas de novo”. Se a história, o enredo, não têm novidades, deixemos que fale a emoção do autor, o seu estilo, o seu modo de encarar a vida e suas adversidades, e teremos sempre o prazer renovado de colecionar mais uma história de vida de mais um lugar pouco conhecido. E a literatura africana é, sim, uma literatura de grande potência, que precisamos urgentemente desbravar. Temos uma dívida imensa para o imenso, rico e fantástico continente africano, não só em termos sociais e econômicos, mas também artísticos: a África, com que os europeus têm mais proximidade, precisa atravessar o Atlântico com essa sua enorme cultura, já que somos um país preto, embora neguemos isso e ainda sejamos estupidamente racistas.
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