Cova 312, Daniela Arbex
Milton Soares de Castro. Talvez você nunca tenha ouvido esse nome. Atrás da morte desse jovem é que foi Daniela Arbex, repórter da Tribuna de Minas, jornal de Juiz de Fora. E escreveu uma longa narrativa, em forma de reportagem. Uma história que podia ser uma ficção de terror, mas foi uma história de terror verdadeira. Dentre muitas e muitas que marcaram os anos de ditatura, os anos do regime militar, a partir do golpe de 1964. Essa é a história do jovem guerrilheiro da Serra do Caparaó, no Espírito Santo, que, em companhia de outros quinze, ousaram desafiar a sanha dos militares. Capturados, foram levados para a Penitenciária Regional de Juiz de Fora, transformada num dos centros de tortura e morte por verdadeiros monstros fardados. Sim, não há outra palavra para designar o direito de torturar, de dispor do corpo e da vida de outra pessoa, sem julgamento, sem nenhum respeito à vida e à humanidade, apenas porque essa pessoa discorda politicamente do governo, seja ele qual for. Se o regime militar que nos assombrou por mais de duas décadas tivesse torturado uma única pessoa, já seria o suficiente para ser condenado ad aeternum. No entanto, foram dezenas, centenas, talvez milhares de cidadãos tão brasileiros quanto os que os torturaram e mataram sem julgamento, sem nenhum sentimento de humanidade, que foram capturados como animais e tratados como seres desprezíveis, seviciados, torturados, mortos, tendo seus corpos mutilados jogados em alto mar ou em covas rasas sem nenhuma identificação que não fosse um simples número. Sem que seus pais, irmãos, amigos tivessem oportunidade de velar seus corpos ou mesmo saber onde foram sepultados. Apenas desaparecidos. Cinzas jogadas ao vento pela estupidez de vis torturadores, verdadeiros criminosos, sem nenhuma compaixão. Quando se veem, nestes tempos bicudos em que vivemos, pessoas que elogiam, exaltam e querem transformar em heróis esses monstros, devíamos ler e reler relatos como o de Daniela Arbex, para que nos voltem a força e a resistência dos opositores do regime militar que nos permitam execrar também como criminosos esses indivíduos que exaltam a ditadura e elogiam torturadores. A busca da autora foi pela verdadeira história de um jovem – Milton Soares de Castro – e de sua sepultura, mas ela entrelaça essa história com a história de muitos outros – homens e mulheres – que também foram perseguidos, presos, torturados; alguns resistiram aos maus tratos e sobreviveram para contar; outros, nem seus corpos puderam relatar o que lhes ocorreu (como disse um médico legista, “um corpo conversa com a gente, conta sua história”). Enfim, mais um livro-reportagem que resgata nossa história recente, que não nos deixa enfiar a cabeça na areia e fingir que nada aconteceu durante os anos de chumbo.
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