quinta-feira, 7 de outubro de 2021

Enseada Amena, Augusto Abelaira

 Enseada Amena, Augusto Abelaira


Literalmente, uma grande experiência literária, tanto a que o autor nos propõe quanto a que experimentamos, desde as primeiras linhas. Não há um foco narrativo, mas vários. Interpõem-se, interpenetram-se, num aparente emaranhado a cujo sentido vamos aos poucos desvendando, para nos surpreendermos com história de várias vidas – Osório e sua mulher, Maria José; Ana Isa e seus maridos, um dos quais está preso, sem que saibamos o motivo, o Amândio; amigos que dizem conhecer o protagonista desde a infância, mas talvez não seja bem assim, como o Alípio... Enfim, realmente tudo costurado pela prosa bem articulada, mas propositadamente construída, ou diríamos, costurada como num patchwork, tendo como fundo a origem da cidade de Lisboa, como, ironicamente, a “enseada amena” aonde aportaram vários povos. Augusto Abelaira desafia nossa percepção e nossa imaginação com esse livro que, repito, é uma experiência de leitura realmente inovadora, para a época em que foi publicado, em 1966, escondendo e, ao mesmo tempo, nos indicando caminhos que nos levam àqueles tempos tenebrosos da ditadura salazarista em vigor desde 1933 e só finalmente derrubada em 1974 pela “revolução dos cravos”. Deixemos claro que Abelaira foi um opositor ferrenho ao “estado novo”, sendo algumas vezes perseguido e preso.


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