quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

A bagaceira, José Américo de Almeida



A bagaceira, José Américo de Almeida


A literatura brasileira viveu um boom do romance regionalista, iniciado na década de 30, exatamente com este livro de José Américo de Almeida, “A bagaceira”. Levando ao extremo uma nova forma de narrar, em que não apenas os aspectos regionais, no caso, o Nordeste, são o elemento central da trama, mas, e principalmente, um trabalho de pesquisa do linguajar típico da região, o regionalismo obteve sucesso de crítica e de público. A obra máxima dessa tendência foi alcançada com Guimarães Rosa, em “Grande Sertão Veredas”, com inovações em todos os aspectos da linguagem, e não apenas no léxico, como ocorre com a maioria dos romances do ciclo nordestino. No entanto, a trama de “A bagaceira” traz-nos, sob uma linguagem às vezes complexa, mas sempre poética, uma história de amor, traição, vingança e redenção familiar, num cenário de miséria e exploração do ser humano, no limite de sua capacidade de resistência a um período especialmente trágico de secas, entre 1898 e 1915. As personagens principais, Dagoberto, dono do engenho, seu filho Lúcio e a retirante Soledade formam um triângulo amoroso de cores dramáticas, envolvendo outras personagens, nessa trama que, principalmente, busca denunciar os problemas crônicos do Nordeste brasileiro, nos seus aspectos sociais, políticos, econômicos, que são a raiz das desigualdades e da exploração exercida secularmente pelos latifundiários e políticos que dominam a região. Talvez não seja um livro muito fácil ao leitor atual, pelo estranhamento que causa o léxico empregado pelo autor, mas, sem dúvida, vencida essa dificuldade inicial, depois de nos acostumarmos com o linguajar típico daquela época, podemos mergulhar com emoção e até com uma certa exasperação numa aventura ainda muito atual, pois, repito, vamos encontrar um mundo que só aparentemente parece distante, porque a luta pela sobrevivência, em qualquer parte do planeta, ainda rende ótimos exemplos de como o ser humano, mesmo em situações adversas, consegue ultrapassar as dificuldades e continuar lutando. E é o que se espera, hoje, quando a ganância de um sistema mundial de exploração das reservas do planeta coloca a humanidade numa encruzilhada entre continuar gastando os parcos recursos que nos restam e comprometer o seu futuro ou frear essa gastança absurda e buscar novas formas de vida e sobrevivência. Encerro esse meu breve comentário convidando ou até mesmo incitando os novos leitores a retomarem a leitura de nossos grandes escritores do século XX, como José Américo, Graciliano, Rosa, Amado, Veríssimo (o pai e também o filho), Clarice, Rachel, José Lins etc. etc. A lista é longa e, pode ter certeza, são autores poderosos, de que podemos e devemos nos orgulhar.

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