Catch 22 (Artigo 22/Ardil 22), Joseph Heller
Quase 500 páginas contra a guerra e contra o capitalismo. É muito? Creio que não. Contra essas duas mazelas da humanidade, nada é excessivo em termos de crítica. Podiam ser milhares e milhares de páginas, ou apenas uma que resumisse todo o horror que as guerras e os processos capitalistas trazem à humanidade. Mas, vamos ao livro “Catch 22” (Artigo 22, em Portugal; Ardil 22, no Brasil). Yossarian é um militar estadunidense, durante a segunda grande guerra, que participa de bombardeios ao inimigo, a partir de uma base situada numa ilha fictícia da costa Italiana, Pianosa. Como comandante de bombardeiros, Yossarian está furioso, porque não consegue dar baixa e voltar aos Estados Unidos: cada vez que obtém o número de missões para isso, os militares aumentam o número de missões e ele tem que continuar a serviço. Talvez por isso, ou pelas circunstâncias da guerra, desenvolve uma mania de perseguição, em que todos querem matá-lo, não só o inimigo. Há um outro elemento fundamental em toda história: se alguém tenta encontrar uma desculpa para ser dispensado, viola o artigo 22 que, na verdade, é um ardil absurdo, uma norma burocrática hilariante e sinistra que diz que um homem é dado como doido se continuar a participar voluntariamente em perigosos voos de combate, mas se apresentar um pedido formal de dispensa é declarado mentalmente são e como tal é-lhe negada a dispensa. Enquanto a guerra e as missões se sucedem a partir da ilha de Pianosa, o autor vai nos desvendando, de forma irônica e até mesmo sarcástica, todo o horror da guerra e também as artimanhas do capitalismo. A guerra, na sua visão, é uma loucura e essa loucura é o que alimenta e estrutura a vida das inúmeras personagens que perpassam pelo livro, com suas neuroses, suas incongruências e ações absurdas. Já o capitalismo tem num dos personagens, um tenente-coronel, seu epítome de canalhice, pois esse indivíduo consegue constituir uma imensa rede comercial, para comprar e vender principalmente víveres e alimentos para as tropas com inúmeros países, até mesmo com o inimigo, chegando ao cúmulo de, num contrato com os alemães, usar os aviões que ele comanda contra o inimigo para bombardear o próprio acampamento. Há muito non sense, muitas histórias ridículas e totalmente absurdas, hilariantes algumas, trágicas outras, mas sempre com um olhar que leva o leitor a compartilhar a lógica irrefutável de que vivemos, principalmente durante um período de conflitos, num mundo absurdo, onde o ser humano é, em última análise, o seu próprio inimigo. O estilo do autor beira o humor negro, com a utilização de repetições circulares e paradoxos, que enfatizam – e eu repito o que o livro deixa claro todo o tempo – a insensatez e a loucura que são as guerras. Encerro este breve comentário sobre essa obra, que considero magnífica, esclarecendo que o tanto o título Artigo 22 quanto Ardil 22, o primeiro em Portugal e o segundo no Brasil, traduzem o termo “catch 22” que, nos Estados Unidos passou a designar uma espécie de situação sem saída, uma armadilha. Ah, sim: a edição que eu li foi a portuguesa, com todo o léxico peculiar da “terrinha”, com o que tive uma diversão extra.
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