terça-feira, 21 de outubro de 2025

Brancura, Jon Fosse

Brancura, Jon Fosse


“Nel mezzo del cammin di nostra vita / mi ritrovai per una selva oscura / ché la diritta via era smarrita.” Com esses versos, Dante inicia sua trajetória pelas três dimensões da morte, o inferno, o purgatório e o céu. Tem a companhia de um poeta e de sua amada para o guiar em sua viagem. Jon Fosse inicia seu romance com um frases banais: “Eu dirigia sem parar. Era bom. Era boa a sensação de estar em movimento”. Mas, logo depois encontramos a referência que me fez lembrar Dante, logo depois de seu carro atolar: “Diante de mim está a floresta, só a floresta, pensei. Então foi até à floresta que esse ímpeto de dirigir me trouxe”. Quem é o motorista? O que ele faz? Por que está ali? São perguntas que o leitor se faz ao continuar a leitura desse romance brevíssimo – ou seria um conto? Não importa o gênero que lhe atribuamos, nenhuma resposta se obtém: apenas o desespero de um homem perdido numa floresta escura. Só. Absolutamente só. Apenas seus delírios, sua imaginação. Mas serão mesmo delírios? Será fruto de sua imaginação o encontro com uma “entidade” de luz? Será fruto de seu delírio o encontro com seus pais? E quem é essa terceira personagem, ainda mais estranha, de paletó preto e gravata branca? Ele tenta conversar com essas figuras, com essas aparições, mas essa conversa trucada e reverberativa é real? Num texto tenso e reiterativo, como num monólogo teatral, o autor vai nos conduzindo pelos meandros da consciência, das incertezas e dos medos de alguém que não sabemos exatamente quem é, mas que nos toca, porque o jogo de claridades e escuridão da floresta e dos pensamentos dessa personagem despertam no leitor algo que parece ao mesmo tempo estranho e familiar. Não há distensão, não há alívio nessa busca interior dentro da floresta escura dessa mente conturbada, em meio à brancura da neve que cai, da lua e das estrelas que surgem e logo são encobertas pelas nuvens. Solidão. Só a solidão, já que a fluidez e a incorporalidade das “aparições” não são, como os guias que Dante teve em sua viagem, um refrigério ou bússola para sua caminhada pela “selva oscura” de sua mente. Um texto ao mesmo tempo estranho e fascinante desse grande escritor norueguês, detentor de uma obra imensa e de um prêmio Nobel de literatura.

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