China: o Socialismo do Século XXI, Elias Jabbour e Alberto Gabriele
Confesso que tive de fazer um esforço enorme para chegar ao final desse livro, não porque não fosse muito bom (e ele é!), mas porque não sou afeito às ciências econômicas, que são, para mim, algo misterioso e tão complexo que às vezes penso que nem mesmo os mais renomados economistas entendem completamente suas leis. Desde que o ser humano passou a produzir algo e a fazer trocas entre si e depois entre tribos etc., até os dias de hoje, quando vivemos num mundo de mais de 180 nações a terem cada uma sua moeda e seu sistema econômico, e mais, realizando entre si trocas complexas, que a Economia tem tentado explicar, através de seus ilustres estudiosos, como tudo isso acontece. Então, seduzido pela promessa de que, ao final da leitura, poderia ter pelo menos uma pequena noção, dentro do que me seria possível compreender, dos mistérios que rondam o crescimento espantoso do planeta China, não titubeei um só momento em continuar desbravando as teorias e as explicações dos autores desse livro complicado, mas esclarecedor. Está ele dividido em duas longas partes. Na primeira, os autores discorrem sobre as várias teorias econômicas e nos levam pelos labirintos de pensamentos complexos e a análises nem sempre compreendidas por um simples mortal como eu, mas que podem ser entendidas e assimiladas por quem entenda economia e, pelo menos, vislumbradas por leigos como eu. De tudo quanto compreendi, e não foi muito nem foi pouco, ficaram para mim duas importantes lições, dentre muitas outras: 1. que o mito do homo economicus é só isso mesmo, um mito, que não prevalece diante das novas teorias econômicas, que se utilizam hoje de ferramentas tão variadas quanto a historiografia, a sociologia e até a neurociência, passando a construir até mesmo uma nova e nunca imaginada pelos pensadores clássicos neuroeconomia; 2. que, apesar de todo o medo do comunismo, incrustrado na mentalidade de uma grande parte da humanidade, Marx ainda é talvez o maior teórico da economia política, sendo que o socialismo é plenamente possível e viável como alternativa ao capitalismo selvagem em que vivemos e como etapa de transição para novas formas de economia muito próximas do comunismo. A segunda parte é dedicada pelos autores a dissecar a economia socialista de mercado exercida pela China, desde 1978, que a colocou na vanguarda dos países desenvolvidos em tão poucos anos. Ficamos sabendo, e os detalhes são muitos, assim como os perrengues vividos pelos chineses, que, ao desenvolver uma economia voltada para o mercado, a China não abriu mão de princípios muito caros ao socialismo, como o controle estatal de todo o processo, ainda que muitas empresas estejam hoje privatizadas. Privatizadas, mas controladas pela máquina estatal, assim como toda a produção e os meios de pagamento constituídos pelos bancos. Deixa esse fato para nós, da esquerda, que nunca concordamos com a sanha privatista dos neoliberais, que as privatizações são mesmo um dos males maiores do capitalismo predatório que não consegue e não conseguirá nunca superar as desigualdades sociais, coisa que o sistema chinês tem conseguido, ao encontrar uma espécie de “caminho do meio” da transição em relativamente poucos anos de uma economia semifeudal para uma economia socialista voltada para o mercado, através de mecanismos extremamente complexos, mas de grandes resultados práticos tanto para o povo chinês quanto para assustar os governos arraigadamente capitalistas e de caráter neocolonialista, que tudo já fizeram para impedir que esse grande país se tornasse tecnológica e economicamente o que é hoje. Há, ainda, uma espécie de apêndice, em que os autores analisam dois outros países de escopo e de algumas (não muitas) semelhanças econômicas com a China: o Vietnã e o Laos. Essa resenha já se estendeu muito além do que pretende ser: apenas um comentário sobre um bom livro que deve ser lido por todos os que se interessam pelos destinos do mundo, mesmo que não sejam economistas, mas que tenham a resiliência de percorrer todas as suas páginas, já que o final vale a pena, ou seja, a mensagem que fica é que há esperança para o socialismo e para uma sociedade mais justa, se conseguirmos – algo que eu sei que é muito, muito difícil, mas não impossível – destruir o capitalismo. Leia e comprove.