A filha do Papa, Dario Fo
Última década do século XV. Um novo papa é ungido à cátedra do Vaticano, um papa originário da nobreza espanhola dos Borgia, que assume o nome de Alexandre VI e inaugura uma era de corrupção, orgias, assassinatos e guerras numa Itália divida (e também a Europa) em inúmeros reinos que não se entendem e vivem estabelecendo frágeis alianças de poder uns contra os outros. Antes de ser escolhido papa, Borgia tinha por amante uma dama da sociedade romana e com ela, quatro filhos. Para fugir ao escândalo, contratou um amigo para fingir ser o esposo e pai das crianças, só revelando a verdade às vésperas de assumir o papado, porque o poder o livraria das intrigas e porque o amigo falecera. Assim, Lucrecia já nasceu num ambiente de falsidade e de luxúria. No entanto, a biografia traçada por Dario Fo segue um roteiro diferente de tudo quanto já se escreveu sobre essa mulher incrível. Nada de fofocas relacionadas a orgias e vinganças, mas a trajetória de uma mulher vítima principalmente de seu irmão, César, um assassino e conspirador que perseguiu todos os maridos e amantes de Lucrecia e assassinou um deles. Os três casamentos dela foram sempre arranjados por interesses do pai, o papa, ou por interesse do irmão. Mesmo seu último casamento, com o duque de Carrara, teve a influência dos interesses políticos da corte papal. Com Alfonso, apesar de todas as desavenças e dificuldades, sua vida se estabilizou e ela, uma mulher culta e muito acima dos estereótipos que se criaram a seu respeito, consegue até mesmo a confiança e o apoio dos cidadãos, por sua honestidade, seu caráter e sua bondade, chegando a substituir o marido na administração do reino. A par da trajetória de Lucrecia, o livro traça um retrato fascinante de uma época complexa, o Renascimento, quando o mundo europeu passa por grandes transformações artísticas, literárias, filosóficas, sociais e políticas, embora o ambiente de intrigas e guerras permeie a política corrupta e eivada de nepotismo, assassinatos, intrigas, traições e alianças que não se sustentam entre os vários reinos feudais. Enfim, uma obra realmente interessante, que nos proporciona uma nova visão do início do Renascimento.