A vegetariana, Han Kang
Da Coreia, esse livro denso, complexo, mas que se lê com prazer e tensão. Divide-se em três partes, três pontos de vista, para contar a história de Yeonghye. A primeira parte é narrada pelo marido, Jeung, um homem comum, que gosta de coisas simples e, por isso, escolhe por esposa uma mulher que não é feia nem bonita, que não é alta nem baixa, que é o exemplo da média da mulher coreana, Yeonghye. Levam uma vida comum, sem paixões e sem brigas, até que um dia, encontra a mulher na cozinha jogando no lixo toda a carne estocada na geladeira e dizendo que, a partir daquele dia, não mais comeria carne, porque tivera um sonho, e é só isso o que ela diz como motivo para sua decisão. Tudo muda na vida do casal. Até que num fatídico almoço na casa da irmã de Yeonghye, o pai, um militar reformado, quer obrigar a filha a comer carne e acaba agredindo-a, o que a leva a cortar os pulsos com uma faca, na frente de todos. Sobrevive. O marido pede o divórcio. Vive, agora, sozinha num pequeno apartamento. A segunda parte é narrada do ponto de vista do marido da irmã, um artista plástico que está em crise de criatividade. Ao dar banho no filho de cinco anos, pergunta à esposa por que o menino ainda tem uma mancha mongólica nas nádegas. Ela lhe diz que isso pode ou não desaparecer, que sua irmã, Yeonghye, tinha essa mancha até os vinte anos e deve tê-la até hoje, quando já tem mais de trinta. O marido entra num delírio erótico de desejo pela irmã da esposa e recomeça a ter ideias para novas obras, mas com a participação dela. Isso leva a uma tragédia, que vai se refletir de forma visceral na terceira parte da narrativa, agora do ponto de vista da irmã. Paremos por aqui, para não antecipar os acontecimentos ao leitor. Não é uma longa história, tem apenas 162 páginas de nos tirar o fôlego. Não cai a autora em psicologismos, mas abre pequenos clarões do passado das irmãs, que nos permitem vislumbrar os motivos que levaram Yeonghye ao estado a que chegou. A violência implícita – muito mais terrível – entrega-nos uma história de quase terror, de que são vítimas tantas mulheres pelo mundo afora, motivações de traumas ocultos por crimes que nunca serão punidos. Enfim, um livro surpreendente, não só pelo exotismo, para nós, do ambiente e de sua origem, a Coreia, mas principalmente pela maestria com que a autora nos conduz pelos caminhos de uma história complexa, tensa e, sobretudo, humana.
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