Doutor Jivago - Boris Pasternak
Talvez a história deste livro seja mais interessante que o próprio livro, nos dias atuais. Rejeitado por editores russos, Pasternak enviou várias cópias do manuscrito a amigos que viviam no Ocidente. Em 1957, Feltrinelli obteve o manuscrito e conseguiu publicá-lo numa edição italiana, apesar dos esforços da União dos Escritores Soviéticos em tentar impedir sua publicação. O sucesso do livro levou o editor Feltrinelli a ceder os direitos a várias línguas, além de ser expulso do PCI. Aí, entrou em campo a CIA: com o intuito de embaraçar o governo soviético, decidiu publicar o livro em língua russa e providenciou para que fosse distribuído no pavilhão do Vaticano na Feira Mundial de Bruxelas, de 1958. Além disso, publicaram-se versões em inglês e francês. E mais: diz a lenda que a CIA ajudou a que o livro fosse submetido ao Comitê Nobel, para que Pasternak ganhasse o prêmio Nobel. Ele, de fato ganhou, mas foi obrigado a renunciar. Politicagem à parte, “Doutor Jivago” pertence à galeria dos romances realistas russos. A história cobre o início da Revolução de 1917 e suas consequências, na década seguinte. Jivago, no começo, é um idealista jovem, formado em medicina, que se casa com Anna Ivanóvna e com ela tem dois filhos. A família é obrigada a se mudar para um lugar distante, nos Urais, onde o doutor reencontra Lara, uma menina que ele vira uma vez há muito tempo e que o encantara. Ela, agora, é uma professora, também meio fugitiva do regime, porque seu marido, que a abandonara por um ideal de luta, tornou-se procurado. Encetam um romance. Mas o doutor é capturado pela guerrilha e passa dois anos longe de casa e de Lara. Ao voltar, a família havia voltado para Moscou e ele reencontra Lara, com quem passa a viver. Lara, no entanto, precisa partir para preservar sua vida e a vida de sua filha. Jivago deixa que ela se vá e, depois de um período sozinho, consegue retornar a Moscou em péssimas condições, como andarilho, praticamente um mendigo, juntamente com um jovem também andarilho. Mas a família havia abandonado a Rússia e estava agora em Paris. Não podendo sair de Moscou, ali vive de alguns escritos e às voltas com miséria, até se casar com Marina, uma vizinha. Com ela, tem duas filhas. Quando, enfim, obtém um bom emprego, não chega a começar a trabalhar... Bem, paremos por aqui. O livro é longo, tem longas descrições de paisagens. E mais: na imensa Rússia, tem coincidências demais. As personagens, que são inúmeras, vivem se encontrando e se reencontrando nas mais diversas situações e lugares. Pode-se dizer que a ficção, quando nos leva para seu mundo, tem liberdades que parecem absurdas, mas se aceitamos o jogo proposto, nós nos acostumamos com elas e as aceitamos. Enfim, para concluir: pode-se desculpar, em termos históricos, a desconfiança e a crítica do autor para com a Revolução; pode-se emocionar com o fervor nacionalista de Jivago e com as agruras por que ele, sua família e também a pobre e perseguida Lara passam; pode-se até desculpar o excesso de coincidências e o seu estilo às vezes repetitivo; pode-se ler o longo romance de Pasternak com um certo prazer, sim, mas não se pode dizer que ombreie com Tolstói, Dostoievski, Pushkin etc.
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