Como se estivéssemos em palimpsesto de putas, Elvira Vigna
Talvez o mais estranho título de um romance que já encontrei. Além de criativo, designa exatamente o formato da narrativa. Entenda-se: palimpsesto significa escrita superposta, ou seja, um manuscrito em pergaminho que, após ser raspado e polido, era novamente aproveitado para a escrita de outros textos (prática usual na idade média, quando os copistas não tinham abundância de pergaminhos). No entanto, o texto raspado permanece lá, nas entranhas das fibras e, com técnicas modernas, pode ser recuperado, total ou parcialmente. Assim, Elvira Vigna constrói sua narrativa, ou narrativas: fatos e acontecimentos que se superpõem e se entrelaçam, para criar um jogo de traições e insinuações, de relacionamentos e frustrações, de poder, mentiras e imaginação. O suporte para todo esse emaranhado de histórias baseia-se no encontro de dois estranhos durante um verão carioca: ela, uma designer desempregada; ele, um engenheiro de TI, contratado para informatizar uma editora moribunda. Dia após dia, João relata para sua interlocutora seus encontros frequentes com garotas de programa, enquanto ela vai preenchendo as lacunas da narrativa com sua imaginação ou vai delineando a vida dele com a mulher e o filho, também ela uma ex-prostituta. Por isso, a concepção de palimpsesto, de sobreposição de vidas de inúmeras prostitutas que surgem, tornam-se importantes durante um breve momento da vida do protagonista, e desaparecem para dar lugar a outras e a outras. Sem dúvida, um romance curioso, que nos convida para um jogo complexo, mas extremamente excitante, em que prevalece a técnica narrativa da autora através de suas repetições de texto, de histórias que ficam pelo caminho e são retomadas depois, ou não, mas que formam um painel de profundo conteúdo humano.
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