domingo, 10 de abril de 2022

A amiga genial, Elena Ferrante

 A amiga genial, Elena Ferrante


Viver para contar. Escrever para viver. Desde que a literatura moderna seguiu pelas trilhas abertas por Proust, as biografias ou autobiografias relatadas no compasso da ficção (ou mesmo da não ficção) constituem rios caudalosos por onde, em geral, o leitor navega com prazer, principalmente quando bem escritas e bem articuladas. E a busca do tempo perdido é daqueles temas sempre caiados de novo e, se bem caiados, sempre muito bem-vindos. E Elena Ferrante, a misteriosa escritora italiana, não nega fogo em sua proposta de uma vasta exumação do passado em Nápoles, de cujo primeiro volume dos quatro escritos, tratamos neste breve comentário. Elena Greco, a narradora, neste primeiro livro, escreve sobre sua infância num subúrbio violento de sua cidade na década de 50 e 60 do século passado, entendendo-se aí a violência que tem origens muitas vezes desconhecidas no ódio entre famílias, nas lutas de jovens mais pobres contra os mais ricos etc., não a violência a que nos acostumamos atualmente. Entrelaçam-se várias histórias, mas o eixo narrativo se concentra na amizade entre ela e sua amiga genial, Raffaella Cerulo, chamada de Lina por todos e de Lila pela autora. Há entre elas uma espécie de disputa pelas melhores notas, levando sempre a melhor a amiga que, ainda menina, desenha croquis de sapatos, inspirados na profissão do pai sapateiro e um desses modelos, longamente criado e montado às escondidas por ela e seu irmão mais velho, também sapateiro, vai-se imiscuir na história e mudar, talvez, o rumo de sua vida. Seu talento e sua inteligência fazem prever para a menina um futuro brilhante nos estudos. Mas as dificuldades da vida levam Lila a trilhar um caminho diverso, abandonando a escola e os livros e casando-se aos dezesseis anos com um rapaz rico que promete tirá-la e à sua família da pobreza, enquanto Elena, mesmo lutando com as mesmas dificuldades, prossegue seus estudos. A narrativa é lenta, mas nos conduz aos meandros e às incertezas das duas garotas, suas relações com vizinhos e amigos, os conflitos familiares etc., de forma envolvente, graças à habilidade da autora. O primeiro “capítulo” dessas vidas se encerra justamente com a festa do casamento de Lila, um casamento que deixa no leitor a sensação de que tem tudo para dar errado. Veremos.




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