A hora da estrela, Clarice Lispector
Clarice Lispector voltou: exposições baseadas em suas obras, comentários nas redes sociais, traduções para outras línguas, novos leitores. Isso é ótimo. Que se revise a literatura dessa grande escritora, que se comentem suas crônicas e contos, que todos comemorem Clarice. Sua literatura nem sempre é fácil, mesmo nos livros menos complexos, como é o caso de “A hora da estrela”. A história da jovem nordestina Macabéa está, neste livro, contada por uma espécie de alter-ego da autora, o escritor Rodrigo S. M. que, à medida que narra, também escancara seu processo de criação. Comenta, no início, que não há muito o que dizer de sua protagonista, com sua vida sem nenhum atrativo. E realmente pouca coisa acontece ao longo de sua trajetória de rotina pontuada pelo tique-taque da antiga Rádio Relógio, que dava a hora certa a cada minuto, enquanto fornecia a seus ouvintes, nesse intervalo, “pérolas” de conhecimentos de almanaque, que é praticamente tudo de informação que alimenta o intelecto de Macabéa e sua vida vazia e sem perspectiva que, no entanto, se “engravida de futuro”, quando ela consulta uma cartomante e essa lhe diz que ela conhecerá um estrangeiro rico, com quem se casará. Mas a previsão se transforma em tragédia. E ao narrador só resta, ao fim e ao cabo, lamentar e chorar o amor que parece ter por sua “heroína”. Esse mesmo tema, de “vidas vazias” e aparentemente sem sentido, é também abordado de forma magistral por Autran Dourado, em “Uma vida em segredo”, num registro estilístico completamente diferente de Clarice, o que nos permite concluir com Machado de Assis que “só existem ideias velhas caiadas de novo”. Mas, quando a caiação é de boa qualidade, que nos empapucemos com as ideias velhas. Salve Clarice. Salve Autran.
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