quarta-feira, 16 de novembro de 2022

O homem sem qualidades, Robert Musil

 O homem sem qualidades, Robert Musil


Mais do que o número de páginas – cerca de 1260 – o que nos levar a ler esse livro com calma e durante muito tempo (levei 45 dias) é o estilo do autor, ou talvez devêssemos dizer, suas extensas reflexões sobre a situação do ser humano no começo do século XX, às vésperas da primeira grande guerra, o que leva a que o livro seja classificado pelos críticos de literatura como um romance filosófico, seja lá o que isso significa. O que me chamou a atenção, além desse fato, foi a onisciência do narrador: ele não é apenas onisciente, ele super onisciente, ou seja, mergulha fundo na mente de todas as personagens, em longas digressões e nos diálogos todos do livro, discutindo questões complexas de suas realidades naquele momento. Dito isso, vamos a uma resenha bem reducionista do enredo do livro. Em 1913, num país imaginário chamado Kakânia, identificado como a Áustria, um matemático de 32 anos, Ulrich, busca um sentido para vida. No entanto, sua moral flexível à realidade e a falta de profundidade de suas ideias transformam-no num “homem sem qualidades”. A pedido do pai, um professor emérito do interior, procura a prima Diotima, a bela, opulenta e rica esposa se um diplomata, de quem se torna amigo e confidente. Com a aproximação de uma data cívica – os cem anos do imperador, a serem comemorados em 2018 – a prima e Ulrich se unem à sociedade burguesa para promover algum tipo de festividade ou de ação que marquem essa data e até mesmo interfiram nos destinos da Europa e do mundo. Criam a Campanha ou Ação Paralela, que passa a fazer reuniões nos salões elegantes da mansão de Diotima, agregando várias personagens para receber sugestões não só dos participantes, mas de todo o povo. Ulrich, no entanto, recebe a notícia da morte do pai e, ao viajar ao interior, para o enterro, reencontra a irmã,
Ágata, bela mulher de 28 anos, que está se separando do segundo marido. Entre eles renasce uma amizade tão profunda e uma identidade de pensamentos e ideias que levam a que irmã vá se reunir a ele na capital. Depois de algum tempo de vida em comum, essa amizade ganha contornos de uma paixão de irmãos siameses, como eles se autodesignam, e os dois irmãos se isolam da vida mundana. Um dia, Ágata encontra uma espécie de diário secreto de Ulrich, onde ele aprofunda suas reflexões a respeito do amor, em longos textos que indicam haver entre eles uma paixão incestuosa. O livro termina, ou melhor, permanece inacabado, já que o autor morreu sem poder concluí-lo. Há anotações apenas em dezenas e dezenas de páginas, de que o romance abordaria em seguida a guerra e o incesto dos irmãos que, concretizado, os levaria a um estado de complexos sentimentos de culpa e de catarse. São várias as personagens do livro, mas duas delas chamam a atenção do leitor: Moosbruger, um assassino e estuprador, condenado à prisão e Clarisse, a esposa neurótica do amigo de Ulrich, Walter, que se recusa a ter uma vida normal e tem fixação na figura na figura do estuprador. Concluindo esse breve comentário, devo dizer que, apesar da complexidade e da extensão do romance, quando cheguei ao final, queria mais, lamentando que tenha ficado incompleto o livro que teria, segundo alguns, mais de duas mil páginas. Mesmo assim, com justiça, uma obra prima da literatura alemã.

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