quarta-feira, 25 de outubro de 2023

A consciência de Zeno, Italo Svevo

 A consciência de Zeno, Italo Svevo


Consciência pode ser a capacidade que tem o ser humano de compreender aspectos ou a totalidade de seu mundo interior. Mas, pode ter também o significado de percepção que o ser humano possui daquilo que é moralmente certo ou errado. Zeno Cosini vive em Trieste, cidade italiana quase fronteiriça com a Áustria, no final do século XIX e início do XX. O vício do tabagismo leva-o a buscar tratamento psicanalítico, na tentativa de largar o cigarro. Seu analista sugere que ele registre suas memórias e sua vida, numa espécie de autobiografia, em busca do conhecimento de si mesmo. Essa a consciência que Zeno busca despertar. Mas, também, em sua trajetória de comerciante, quando se apaixona por uma das três filhas de outro comerciante mais velho e se vê rejeitado e acaba por se casar com uma outra irmã, provocando em si mesmo sentimentos complexos de amor e ódio, de fidelidade e traição, de práticas de negócio nem sempre pautadas pela melhor forma, Zeno também lida com aspectos morais típicos de um anti-herói disfuncional e burguês do romance do início do século. O desconforto em relação ao mundo e a capacidade de ultrapassar os obstáculos que se apresentam, para alcançar grandes feitos, acompanham os heróis clássicos, desde tempos de narrativas imemoriais. Até Cervantes. Dom Quixote, com sua inadaptação ao mundo, luta com gigantes imaginários, desvendando as misérias e a consciência interiores do ser humano renascentista, inaugurando o anti-herói moderno. O realismo, mesmo buscando resgatar os princípios gregos de heroicidade e de realidade, nunca jogou no lixo a luta interior de seus heróis, seus dilemas éticos e filosóficos. Italo Svevo, contemporâneo e amigo de James Joyce, havendo mesmo entre eles uma admiração recíproca, comunga com o inglês a capacidade de trazer para a literatura toda a disfuncionalidade e toda a complexa teia de dilemas morais, éticos e filosóficos dos humanos do século XX, anti-heróis que desbravam para nós, seus leitores, o fascínio da mente humana e de suas contradições, despertando, portanto, novas consciências diante de um mundo cada vez mais complicado, não só para o indivíduo, mas também para todas as sociedades e povos e nações, que não se entendem e vivem em pé de guerra. Talvez por isso, seja “A consciência de Zeno” considerado um dos melhores romances italianos de todos os tempos e um dos grandes romances do século XX. Não é uma leitura “de fim de semana”, mas um livro para se degustar lentamente, parágrafo por parágrafo, linha por linha, as suas quase quinhentas páginas.


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