Uma questão pessoal, Kenzaburo Oe
Um protagonista que não tem nome, conhecido apenas por seu apelido Bird. Leciona inglês num cursinho em Tóquio e tem 27 anos. Sonha com a África, em ir para a África. Por isso, coleciona mapas da África. No entanto, sua esposa está no hospital, em trabalho de parto. Meio distante dela, tenta não retornar ao vício da bebida, enquanto aguarda o nascimento do bebê, mas não consegue. Bêbado, procura a companhia de uma ex-colega de faculdade, Michiko, uma jovem viúva, cujo marido se matou e que hoje leva uma vida livre. A ideia de paternidade mexe com a cabeça dele, Bird, porque imagina que seus sonhos naufragarão. A situação se complica quando fica sabendo que o nascituro tem uma anomalia cerebral e o menino, possivelmente, terá uma vida vegetativa. Sua angústia cresce à medida que se envolve com Michiko, a ex-colega, e à medida que peregrina pelos bares, com a ideia fixa de que deverá matar a criança. Em torno dessa obsessão, o autor nos leva aos meandros da mente de Bird, sem nenhum julgamento moral, apenas narrando o que se passa com o homem que sonhava com a África, que tinha um bom emprego (foi despedido, porque vomitou em plena aula, por estar bêbado), que nunca se imaginara pai e agora se vê preso a uma criatura que vai depender dele para o resto da vida. Seu ressentimento vai num crescendo de angústia e de tormento, inclusive para o leitor que, embora também angustiado, não consegue despregar os olhos da narrativa, mesmo que ele possa vislumbrar, de forma intuitiva, ou levado pelas próprias circunstâncias do enredo complexo e difícil, que ainda haverá esperança de que tudo isso termine de alguma forma não muito cruel. Enfim, não é um romance fácil, todavia é fascinante, pela maestria do escritor que, mesmo através de um narrador onisciente, nos transmite toda a trajetória de desalento e angústia de seu personagem. A ressaltar, para finalizar esse breve comentário, que o autor, Kenzaburo Oe, passou exatamente por uma experiência semelhante, em 1964, quando recebeu a notícia de que seu primeiro filho nascera com uma anomalia cerebral.
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