sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Uma questão pessoal, Kenzaburo Oe

Uma questão pessoal, Kenzaburo Oe


Um protagonista que não tem nome, conhecido apenas por seu apelido Bird. Leciona inglês num cursinho em Tóquio e tem 27 anos. Sonha com a África, em ir para a África. Por isso, coleciona mapas da África. No entanto, sua esposa está no hospital, em trabalho de parto. Meio distante dela, tenta não retornar ao vício da bebida, enquanto aguarda o nascimento do bebê, mas não consegue. Bêbado, procura a companhia de uma ex-colega de faculdade, Michiko, uma jovem viúva, cujo marido se matou e que hoje leva uma vida livre. A ideia de paternidade mexe com a cabeça dele, Bird, porque imagina que seus sonhos naufragarão. A situação se complica quando fica sabendo que o nascituro tem uma anomalia cerebral e o menino, possivelmente, terá uma vida vegetativa. Sua angústia cresce à medida que se envolve com Michiko, a ex-colega, e à medida que peregrina pelos bares, com a ideia fixa de que deverá matar a criança. Em torno dessa obsessão, o autor nos leva aos meandros da mente de Bird, sem nenhum julgamento moral, apenas narrando o que se passa com o homem que sonhava com a África, que tinha um bom emprego (foi despedido, porque vomitou em plena aula, por estar bêbado), que nunca se imaginara pai e agora se vê preso a uma criatura que vai depender dele para o resto da vida. Seu ressentimento vai num crescendo de angústia e de tormento, inclusive para o leitor que, embora também angustiado, não consegue despregar os olhos da narrativa, mesmo que ele possa vislumbrar, de forma intuitiva, ou levado pelas próprias circunstâncias do enredo complexo e difícil, que ainda haverá esperança de que tudo isso termine de alguma forma não muito cruel. Enfim, não é um romance fácil, todavia é fascinante, pela maestria do escritor que, mesmo através de um narrador onisciente, nos transmite toda a trajetória de desalento e angústia de seu personagem. A ressaltar, para finalizar esse breve comentário, que o autor, Kenzaburo Oe, passou exatamente por uma experiência semelhante, em 1964, quando recebeu a notícia de que seu primeiro filho nascera com uma anomalia cerebral.

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