Uma rua de Roma, Patrick Modiano
Qual é o verdadeiro nome do narrador? Aliás, quem é ele? No começo, apenas sabemos que se chama Guy Roland (nome que lhe foi atribuído por documentos falsos) e que está se despedindo de seu patrão, o dono de uma agência de investigação, um detetive particular, com quem trabalhou durante alguns anos. E que vai em busca de sua identidade, seguindo uma pista improvável, o dono de um bar onde se realizam casamentos. A partir daí, seguimos com ele por uma viagem sem volta pelas ruas e becos de Paris, por apartamentos decadentes, tomando conhecimento de inúmeros personagens de distintas nacionalidades, cujas memórias lhe permitem tecer aos poucos, através de lampejos de recordações de seu passado, sua trajetória de vida, até regiões completamente alheias a seu verdadeiro habitat, como Bora-Bora. Uma linda mulher (sua esposa?), alguns amigos (algum traidor?) e uma fuga frustrada pela fronteira da Suíça, e onde estão todos os outros? Alguns já morreram, outros se lembram disso ou daquilo. E ele vai, num verdadeiro labirinto de memórias, como labirínticas são as ruas parisienses, mergulhando em si mesmo, superando a amnésia que o acometera, para chegar a uma rua que realmente existe: La Vie delle Bottegne Oscure, parte de um gueto judaico-romano, daí o título da edição brasileira, sendo, no entanto, o título original do livro “Rue des Boutiques Obscures”. Mistério e busca de si mesmo, o mistério de um tempo muito obscuro, de um tempo que não deve se repetir, de muito sofrimento, de perseguições, de fugas e de mortes, um tempo negro, sem que o autor cite uma vez sequer o motivo da fuga e perseguição de seu protagonista, ou mesmo as mazelas desse tempo, numa narrativa envolvente e, ao mesmo tempo, fascinante e às vezes angustiante, que não deixa ao leitor qualquer dúvida sobre o fato de estar lendo um dos melhores autores da ficção francesa de nossos tempos.

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